sábado, 22 de abril de 2017

Deusas Celtas Soberanas da Terra e da Guerra (parte 3)

Na filosofia celta não existia vida sem morte, nem paz sem guerra. Cada ser traz em si estes elementos e pela sua percepção vemos a necessidade do seu equilíbrio, que pode ser desestabilizado pela supervalorização de uma característica em detrimento de outra. Nosso desenvolvimento espiritual depende da compreensão e harmonização de todos oselementos que fazem parte do nosso ser. Somente conhecendo a face escura e selvagem e “domando-a”, poderemos tomar consciência da nossa divina complexidade, conhecendo assim a verdadeira e completa natureza. É possível unir as qualidades maternais e femininas com os aspectos guerreiros, os dons da arte, magia e sedução.
Em muitas referências míticas, iconográficas e literárias vê-se a forte ligação entre as deusas da guerra e a presença de mulheres nas batalhas. Indo além das interpretações tendenciosas romanas e as difamações cristãs, percebemos esta ligação como uma associação simbólica entre guerra e ritual. Para os celtas a caça era uma atividade que envolvia rituais para assegurar o sucesso, da mesma forma como as mulheres celtas vestidas de preto, com os braços elevados e proferindo maldições contra os conquistadores romanos tinham um forte componente ritualístico. As sacerdotisas que atuavam nos campos de batalha usavam encantamentos para atrair poderes sobrenaturais e direcioná-las contra os inimigos, fortalecendo seus companheiros para não recuar perante o inimigo. Os historiadores r omano s descreveram as mulheres celtas como bruxas ferozes e ameaçadores, altas, robustas, com pele alva e olhos azuis e longos cabelos ruivos, sacudindo os punhos com raiva e gritando maldições. Em outras situações, as mulheres ficavam com seus filhos na retaguarda e incentivavam seus homens com gritos e orações para que lutassem melhor e não desistissem.
Das inúmeras mulheres guerreiras, sacerdotisas e rainhas poderosas sobressaem-se duas famosas rainhas: Cartimandua, dirigente dos Brigantes, sacerdotisa da deusa Brigantia e Boudicca governante dos Iceni, que se tornou famosa por venerar a deusa Andraste ou Andarta, a deusa da guerra citada por várias fontes. O nome Boudicca ou Boadiceia se origina na palavra celta bouda que significa vitória. A sua história é repleta de atos de coragem nas batalhas e crueldade com as prisioneiras, que eram empaladas vivas e mutiladas como oferendas sangrentas para a deusa Andraste e uma vingança pelo estupro das suas filhas e a conquista da terra pelos romanos. Existe um forte elo entre Boudicca e Andraste, podendo serem vistas como aspectos de uma mesma entidade, uma residindo no mundo sobrenatural e a outra sendo uma valente dirigente e cruel guerreira humana, ao mesmo tempo servindo como sacerdotisa da deusa da guerra.
Andraste ou Andred cujo nome significa ”A Invencível' era uma deusa irlandesa equiparada com Andarte cultuada na Gália e com características semelhantes à Morrighan, sendo evocada na véspera das batalhas para garantir a vitória. Os romanos diminuíram seu status para uma deusa lunar (por ser a lebre seu totem) e a associaram ao amor e fertilidade. No entanto, o arquétipo original de Andraste é de uma deusa escura e ceifadora, invocada apenas nos momentos de extrema necessidade, pois ela exigia sacrifícios de sangue humano, considerado o mais potente substrato mágico. Ela controlava os fios da vida de cada ser humano, do nascimento até a morte, pois a morte era parte inevitável da vida. O seu lado sombrio (da anciã) era amenizado pelos seus atributos de deusa lunar, regente do amor e da fertilidade (como mãe criadora da vida) e regente da caça (na sua face de donzela).

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