A deusa canaãnita era Belit Ilani, chamada de “estrela
vespertina do desejo” ou “amante dos deuses”, equiparada com as deusas sumérias
Astarte, Ninlil e Ninhursag ou que aparecia amamentando uma criança enquanto a
abençoava com a mão direita. Posteriormente os sacerdotes do deus Marduk passaram
a denominar as antigas deusas como esposas dos novos deuses: a deusa Belit foi renomeada
Zarbanit e considerada apenas a esposa do deus Marduk e o casal divino assumiu
os antigos títulos de Bel e Beltu, “o Senhor e a Senhora” substituindo os
deuses Ninlil e Enlil da Babilônia, os regentes da terra.
Ashtoreth era
a principal divindade dos semitas matrifocais, “Matriarca das tribos, Mãe da
fertilidade e do amor, Condutora nos tempos de paz ou guerra”.
No Velho
Testamento usado no sul do Canaã, onde a maior parte de hebreus tinha se
estabelecido, o nome de Ashtoreth era sempre usado junto ao de Baal. Ao longo
do tempo, os sacerdotes hebreus passaram a chamar a divindade de Ele em lugar
de Ela e
desconsideraram a existência da Deusa, causando o que o
mitólogo Joseph Campbell denominou de “mitologia distorcida e falsificada”.
Vários mitos originais foram recontados de forma tendenciosa e a Bíblia passou
a ser censurada pelos sacerdotes, que tinham o poder de decidir sobre o que
podia ou não ser incorporado na história dos patriarcas de Israel. Muitos
relatos bíblicos foram baseados em eventos históricos confirmados pelas
escavações arqueológicas, documentos e artefatos canaanitas, mas as histórias
sobre a religião pagã de Canaã foram contadas da maneira mais vantajosa e
aceitável pela teologia hebraica. Várias confusões e distorções predominaram
acerca da identidade e gênero da Deusa, fosse ela Ashtoreth ou Asherah. No
entanto, o simbolismo, a reverência e os costumes da antiga religião da Deusa
continuaram até 630 a.C., apesar da sua proibição.
As escavações
feitas no Sinai na década de 70 revelaram um altar com inúmeras inscrições e
desenhos nas paredes e nos pithoi (os enormes vasos de argila usados para
guardar comida e bebidas). Uma das figuras é de uma mulher sentada no trono e
servida por seres meio-animais-meio humanos. Também se encontra a figura de uma
vaca amamentando um bezerro e uma procissão lhe trazendo presentes. Na inscrição
pode ser lida a frase: “Seja abençoado por Asherah e Jahweh”. Asherah era a Mãe
divina, uma das mais poderosas e por muito tempo cultuada em Canaã, enquanto a
vaca é um símbolo universal das deusas mães;
Jahweh ou Jeová é o deus do Velho Testamento, herdeiro
de Baal.
Asherah era chamada de “Senhora do mar” ou “Senhora da
luz e da chuva”, mãe dos setenta deuses, uma Deusa-mãe por excelência, que
nutria deuses e seres humanos e oferecia orientação através das suas sacerdotisas
oraculares. Ela era cultuada sob a forma de
uma árvore ou um pilar de madeira (também chamado asherah,
plural asherim) encontrado nos altares dos templos, nas colinas ou nos bosques
sob as árvores frondosas, onde eram comemorados os rituais da lua cheia e os
ritos sexuais. Eles representavam os símbolos da deusa Asherah, que era
venerada como a “Árvore da
vida” ou o corpo da “Deusa da terra”. Eram estes
lugares e objetos sagrados que os profetas de Israel se empenharam em destruir,
mas sem conseguir totalmente, pois são encontradas várias citações na Bíblia
sobre as “recaídas” frequentes dos hebreus nas suas antigas práticas e cultos.
De forma velada ou escondida, os hebreus continuavam a cultuar a Deusa com os
asherim, os ídolos esculpidos em madeira e as oferendas sob as árvores.
Alegando que a destruição dos vestígios pagãos tinha sido ordenada pelo Jeová,
os sacerdotes quebravam os pilares, derrubavam templos, incendiavam os asherim
e proibiam qualquer prática pagã, os transgressores sendo condenados “ao fogo
do inferno”.
A “Senhora
Asherah do mar” era conhecida também como Atargatis ou Derketo e um dos seus
símbolos era o peixe; às vezes ela era representada com rabo de peixe. Descrita
como outro aspecto de Asherah, o culto de Attargatis persistiu até 200 d.C.
sendo chamada de “Senhora da vida”. Ela era força da vida, benevolente e nutridora,
que trazia a fertilidade pela água, encontrada nas florestas, auxiliando as
mulheres nos seus partos e
no plantio dos campos. O seu nome tinha origem no termo
“correto” e os seus atributos incluíam a retidão moral, que ela exigia dos seus
fieis e a postura ereta durante os rituais, representando o poder das árvores.
A sua
representação não era humana, apenas um simples tronco de árvore, porém nos
seus altares havia estatuetas femininas de argila ou inscrições com uma deusa
cavalgando um leão e segurando serpentes nas mãos.
Texto Mirella Faur
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